Bean bag' matou são-paulino em confronto entre policiais militares e torcedores
Uma munição de "bean bag" atingiu a cabeça do são-paulino Rafael dos Santos Tercilio Garcia e o matou, durante confronto entre torcedores do São Paulo Futebol Clube (SPFC) e agentes da Polícia Militar (PM), no domingo (24), do lado de fora do Estádio do Morumbi, na Zona Sul da capital.
Essa mesma munição foi usada no domingo pela PM. A Polícia Civil investiga o caso como homicídio decorrente de tumulto e ainda tenta identificar de onde partiu o tiro e quem atirou. A investigação quer saber se o disparo foi feito por um policial militar ou por outra pessoa (saiba mais abaixo).
A informação sobre a causa da morte de Rafael foi confirmada nesta quinta-feira (28) à imprensa pela delegada Ivalda Aleixo, diretora do Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Segundo ela, peritos da Polícia Técnico-Científica já adiantaram para a investigação o que o laudo sobre a causa da morte deverá concluir.
"De uma forma preliminar, né, porque foi feito um exame no corpo da vítima, foi uma munição chamada 'bean bag' [que atingiu Rafael]. Então foi isso que provavelmente causou a morte [dele] por traumatismo cranioencêfálico, e é o que nós temos ainda preliminarmente no laudo. Aguardando o laudo, agora definitivo, para saber o que exatamente causou a morte, mas preliminarmente nós já sabemos", disse Ivalda ao g1 e a TV Globo.
Além de ter encontrado um artefato de 'bean bag' preso à cabeça de Rafael, a perícia achou mais três munições do mesmo tipo do lado de fora do estádio. O boné que ele usava ficou com um furo na parte de trás, provavelmente por causa do disparo.
O laudo da causa da morte está sendo feito pelo Instituto Médico Legal (IML). O laudo sobre o artefato que matou Rafael será produzido pelo Instituto de Criminalística (IC). Uma reconstituição virtual do crime também será realizada. Os resultados dos exames ainda não ficaram prontos.
O que são 'bean bags'
Delegada Ivalda Aleixo, do DHPP, confirma que 'bean bag' atingiu e matou são-paulino — Foto: Anderson Colombo/TV Globo |
"Beans bags" ("sacos de feijão", numa tradução literal do inglês para o português) são na prática pequenas esferas de chumbo envoltas por plástico que ficam dentro de sacos de tecido sintético. A Polícia Militar paulista usa esse mesmo tipo de munição desde 2021.
E apesar de PM ter admitido somente nesta quinta-feira ter usado as "bean bags" no domingo para conter são-paulinos, a Polícia Civil ainda quer saber se o artefato que matou Rafael é mesmo da corporação, e quem atirou no torcedor: se foi um agente da PM ou não.
"Agora que [a investigação] está afunilando. Porque sabemos o que atingiu [o torcedor], que tipo de munição, que é a 'bean bag'", falou a diretora do DHPP à reportagem. "Já sabe o que o atingiu: Foi uma 'bean bag'. Mas nós não sabemos de onde partiu."
DHPP ouvirá PMs
Mesmo assim, Ivalda disse ainda o DHPP vai chamar policiais militares que participaram da ação e outros torcedores e testemunhas que estavam no local para prestarem depoimento e ajudarem a identificar quem atirou.
"A gente trabalha com várias hipóteses. Não sabemos de onde veio [o disparo] ainda. Isso vai nos permitir saber de onde partiu [o tiro] e saber quem arremessou, disparou seja lá o que for", falou a diretora. "Quem estava perto dele [de Rafael].... Óbvio, que se for necessário, vamos chamar a Polícia Militar, porque foi ela que conteve, mas em momento algum aqui, alguém, ninguém da equipe aí, ficou pensando só apenas nisso, né. São vários quadros possíveis em que pode ter acontecido."
A polícia também analisa as imagens de vídeos e câmeras de segurança para tentar identificar quem atirou na cabeça do são-paulino. Numa das imagens que circulam na web, um policial militar aparece armado, atirando para o chão na direção de torcedores. Não é possível saber que tipo de munição ele estava usando.
Tiro foi dado a curta distância
Boné que teria sido usado por Rafael Garcia tem furo na parte de trás — Foto: Reprodução |
Mais cedo, Ivalda havia falado com a Rádio CBN, informando que o disparo que matou Rafael foi dado por quem estava perto do torcedor.
"Foi muito próximo dele [de Rafael]. Porque o impacto foi muito forte. Acertou diretamente nele e à distância curta. Normalmente esse tipo de munição é disparado a uma distância maior justamente para não causar nenhuma lesão", disse Ivalda à CBN.
Segundo o protocolo da PM, as "bean bags" devem ser disparadas a uma distância mínima de até 6 metros. Abaixo disso há risco para quem fora atingido. A vítima tinha 32 anos, deficiência auditiva, e foi encontrada desacordada após a confusão. A morte foi confirmada num hospital da região.
PM admite uso de 'bean bags'
Nota da Secretaria da Segurança Pública (SSP) confirmou que a PM usou "bean bags" e outras munições no domingo contra os são-paulinos no entorno do Morumbi.
"Na ocasião, os policiais militares realizaram ações de controle de multidão com uso de munições de menor potencial ofensivo como bean bags, elastômero e jatos de água", informa trecho do comunicado divulgado pela pasta da Segurança.
Elastômero é o nome técnico para balas de borracha. Essa munição como as "bean bags" são consideradas menos letais.
Apesar disso há casos de mortes registradas pelo mundo no uso de "bean bags". Em 2019 um manifestante morreu na Colômbia depois de ter sido atingido pela munição. E em setembro deste ano uma mulher foi morta após ser ferida pelo artefato. Desde 2021, quando a PM passou a usar esse tipo de munição, essa seria a primeira morte com uso dela no estado de São Paulo e possivelmente no Brasil.
'Bean bags' x balas de borracha
As "beans bags" estão sendo usados pela PM para substituir gradativamente as balas de borracha, que, segundo a corporação, apresentaram falhas em testes. Entre os problemas foram detectados desvios de trajetória durante os tiros, colocando pessoas em risco.
Tanto a "bean bag" quanto o elastômero (nome técnico da bala de borracha) são disparados por uma espingarda calibre 12. Segundo protocolos da PM, as "bean bags" têm de ser disparadas a uma distância mínima de 6 metros, enquanto as balas de borracha precisam de 20 metros para ter segurança de que não causará um dano maior a quem for atingido.
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